sábado, 26 de maio de 2007

Carta do Professor Doutor António Brotas (IST)


À ATENÇÃO DOS CANDIDATOS À CÂMARA DE LISBOA


O texto que se segue foi escrito e enviado para o "Expresso" há uma semana e teria tido gosto em o ver hoje publicado. Já estaria, no entanto, desactualizado. A campanha para a Câmara de Lisboa estava em risco de se transformar num referendo pró, ou contra o aeroporto da Ota.

A intervenção de ontem do Exmo. Senhor Presidente da República alterou profundamente a situação.

O país vai mesmo discutir a localização do novo aeroporto de Lisboa (do NAL).

Esta discussão durará, possivelmente, dois anos. Se, no final, se concluir que o NAL pode ser construido num local da margem Sul (há vários locais pelo menos à primeira vista propícios para isso) são ganhos dois anos porque um aeroporto na margem Sul demora, no mínimo, quatro anos menos a construir do que um aeroporto na Ota.

Infelizmente, o ministro Mário Lino não esperou três dias. Abriu um concurso para adjudicar o projecto de um aeroporto na Ota e fez esta semana uma pré-selecção de três concorrentes. Por mais competente que seja o vencedor e por melhor que trabalhe, projectará sempre um aeroporto acanhado, com maus acessos, deficiente sobre muitos aspectos, caro, muitíssimo dificil de construir e insuficiente para servir o país por um largo periodo. (Que o ministro comparou a um indivíduo sem uma perna, com um braço partido e todo torto, mas sem um cancro).

Se, entretanto, se concluir que que o NAL pode ser construido na margem Sul, o projecto do aeroporto da Ota vai para o lixo. O país perderá bastante dinheiro, mas não fica com o futuro atrofiado como seria o caso de embarcar numa obra errada.

A única questão que pode ser impeditiva da construção do NAL na Margem Sul e que exige um estudo sério e aprofundado é o da protecção dos aquíferos subterraneos. O debate sobre esta questão, que foi levantada por alguns ambientalistas, pelo próprio ministro, pelo Presidente da CCRLVT e, mais recentemente, por alguns professores de Coimbra, deve ser conduzido com grande abertura e limpidez para ser convincente. Dispomos de dois anos para o fazer porque os estudos sobre o aeroporto da Ota propriamente dito estão atrasadíssimos.

Em qualquer caso, os estudos sobre os aquíferos serão sempre uteis, pois sensibilizarão o país para a importantíssima questão da sua protecção, que não é um problema posto unicamente pela construção de um aeroporto mas, também, por uma série de outros projectos industriais, urbanísticos e agricolas.

O outro argumento impeditivo apresentado pelo ministro, o dos choques de aviões com aves migratórias, é perfeitamente risivel. Numa primeira ocasião procurarei escrever sobre ele para recordar os estudos de 1999 e me interrogar sobre os actuais.

É altamente desejavel que os candidatos à Câmara de Lisboa se interessem por estes assuntos e exijam que sejam sériamente estudados. Mas, no periodo curto da campanha, não são eles que o podem fazer, e há outros assuntos mais directamente relacionados com a cidade que devem reter a sua atenção. É esse, no fundo, o tema do texto que segue, escrito há uma semana.

António Brotas


Carta a António Costa sobre uma resposta de entrevista dada ao Expresso

19 de Maio

Gostaria muito de publicar no Expresso no próximo Sabado o texto que se segue. (A forma pode ser a de uma carta digida ao António Costa ou outra qualquer com o título que o jornal desejar). Dada a rapidez com que decorrem os acontecimento daqui a 15 dias o texto está ultrapassado.
António Brotas


Caro António Costa,

Li na 3ª página do "Expresso" de hoje que à pergunta :"Se for eleito presidente o que vai acontecer ao Aeroporto de Lisboa?" respodeu: "Deve ser desactivado. O futuro grande debate em Lisboa deve centrar-se no destino a dar aos terrenos devolutos".

Ora, o aeroporto de Lisboa vai estar em funcionamente 10, 20 ou mais anos. Nem sequer está provado que deva ser desactivado. Um novo aeroporto para a região de Lisboa (NAL) é em absoluto necessário para substituir ou completar o da Portela. É algo que decidiremos daqui a alguns anos. A última coisa que podemos agora desejar é que o debate sobre o destino a dar aos terrenos (ainda não devolutos) da Portela venha inquinar o problema da escolha da localização NAL .

Em qualquer, caso há problemas muito mais urgentes a tratar.

Assim, o Partido Socialista propos-se no seu programa eleitoral para as legislativas construir uma ponte para o Barreiro para TGV atravessarem o Tejo. No dia 6 de Março, a Secretária de Estado Ana Vitorino confirmou, na Sociedade de Geografia este propósito. No final de Março, o Ministério precisou que a ponte seria rodo-ferroviária e que a estação terminal seria nas Olaias.

No programa do Partido Socialista a ponte para o Barreiro era, porém, destina aos TGV para Badajóz, para o Algarve, para o Porto e ainda para um shuttle para o aeroporto da Ota, enquanto que, no documento "Orientações estratégicas para o sector ferrroviário" divulgado pelo MOPTC, em 28 de Outubro, está prevista uma entrada a Norte de Lisboa pelo Lumiar para o TGV para o Porto.

O que está actualmente previsto são, assim, duas entradas para o TGV em Lisboa. Se o propósito for para diante, tal significa que a Câmara de Lisboa terá de se defrontar com o gigantesco problema ambiental e urbanistico criado pela construção de 10 km de vias para os TGV circularem no interior da cidade (e ainda ninguém precisou onde serão em tunel, em viaduto ou à superfície).

Os estudos de engenharia necessários para construir a ponte do Barreiro e as linhas para os TGV no interior de Lisboa, na margem Sul, e pela margem Norte até à Ota ainda não estão feitos.(Este último trajecto foi posto de lado há poucos anos pela REFER dado o seu custo excessivo). A decisão definitiva sobre o projecto global das entradas do TGV em Lisboa e, consequentemente, sobre a ponte do Barreiro, não está, assim, ainda tomada.

Quem tem de decidir sobre estes assuntos é, sem dúvida, o Governo.

Mas, qual é o papel da Câmara de Lisboa no meio de todas estas questões?

É a pergunta a fazer aos candidatos a esta próxima eleição. O que não é admissivel é que, enquanto o Governo faz os seus projectos, a Câmara se entretenha a aprovar urbanizações incompativeis com esses mesmos projectos.

O que propõe é que a Câmara reivindique o direito de ser ouvida e mantida informada e, ainda, que, simultaneamente, assuma como prática normal estudar com antecedência e transmitir ao Governo sugestões e opiniões sobre os problemas que interessem directamente à cidade. Mas, para isso, a Câmara tem de se preparar.

O que julgo indicado, é a Câmara criar um gabinete de estudos, francamente aberto a uma colaboração exterior, por exemplo, das Universidades, vocacionado não para decidir, mas para estudar e analisar os projectos das grandes infraestruturas de transportes.

No que diz respeito à travessia do Tejo, não acredito que vá ser tomada nenhuma decisão definitiva nestes dois anos. Há, no entanto, uma proposta simples sobre a qual parece haver consenso. A proposta de Portugal na Cimeira Ibérica deste ano propor à Espanha a construção com grande prioridade da linha TGV de Badajoz ao Pinhal Novo (onde há uma estação da Fertagus).

Um gabinete de estudos como o referido pode debruçar-se sobre esta proposta e, no caso de concordar com ela, pode propor à Câmara de Lisboa para a apoiar vivamente. Se esta proposta for aceite, teremos, então, dois ou três anos para estudar seriamente o problema da travessia do Tejo, muito relacionado com o problema do traçado da linha do TGV para o Porto. O gabinete referido deverá estudar estes problemas mantendo um diálogo com o Ministério e com os municípios vizinhos, mas dando especial atenção às suas implicações sobre Lisboa.

Entretanto, deverá dar especial atenção aos problemas internos da cidade, dialogando com a Carris, a CP e a empresa do metro. A meu ver, por exemplo, estão erradas as extensões actualmente previstas da rede vermelha do metro para o Aeroporto e para Campolide (bairro) . Lamento que tenha sido posta de lado a saida prevista para o lado de Sacavem que evitaria a entrada diária de dezenas de milhares de carros na cidade. A ligação da gare do Oriente ao Aeroporto podia ser feita com um investimento incomparavelmente menor (e mais cómodo para os utentes) por 6 autocarros que fizessem uma navete pela Avenida de Berlim. Do outro lado, o metro devia ir à estação de Campolide e não ao bairro de Campolide. Depois, devia descer a Av. de Ceuta. Transportados à superfície, os futuros moradores nesta avenida (que alguns pensam urbanizar com torres) irão inevitavelmente engarrafar o táfego vindo pela Autoestrada e pela Marginal. No que diz respeito a Campo de Ourique, o acesso às traseiras do bairro pode ser feito por escadas rolantes a partir de uma estação na Av. de Ceuta. É o processo de dignificar toda aquela zona.

São isto questões de simples bom senso, de quem pensa um bocado e conhece os locais, que podem, talvez , sensibilizar os candidatos.

António Brotas

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